segunda-feira, 18 de abril de 2011

Chalera#04

Ele fazia falta para alguém?

Essa era a pergunta q atormentava a sua mente, um dia depois do outro, a primeira coisa que pensava quando acordava.

'Eu faço a vida de alguém melhor? Eu já fiz isso?'.

A resposta parecia tão longe, tão escura. Geralmente a maior preocupação era com ele mesmo, mas tinha dias que algo doía, algo mais cortante que a garrafa quebrada que quase arrancou o dedo indicador na última noite. E porque ele estava lá? Porque ele sentia a necessidade de estar?

Chalera estava em crise. Sempre acontecia perto do aniversário do primeiro porre, ha vinte anos atrás. A idade alcoólica dele, vinte anos. Se olhava no espelho e via ali, vinte anos. Vinte anos mais velho do que deveria parecer, tinha o aspecto de um homem de 53, depois de ser atropelado por um caminhão. Não via mais a beleza que via um dia,

em todos aqueles copos e garrafas. Cigarros e prostitutas. Mas entre a feiúra do mundo real e o surrealismo torto do seu próprio mundo, preferia ser seu próprio Dalí, e pintar relógios que se derretiam em vomito e sangue, sangue podre.

Ele tinha duas escolhas, beber até morrer aos poucos ou beber até morrer de uma vez só, engolindo o próprio vomito.

Como a idéia de engolir o próprio vomito não lhe agradava, era isso, beber até morrer, lentamente.

Não achava que faltava muito. Se saía na chuva sentia como se fosse uma esponja, molhada e apodrecida. Se saía no sol, podia apostar que iria se desintegrar aos poucos. De qualquer maneira, tinha a sensação que ira perder pedaços do corpo

aos poucos. Caminhando na rua, caía um pedaço de braço. No outro dia, um pedaço de perna, e assim em diante. A carne dele era podre.

Será que a doença da consciência tinha atingido ele? Será que ele se incomodava em saber que não tinha a quem amar e quem amasse ele?

Besteira, ele tinha quem amar. Ele era amado. A bebida amava ele, ele amava beber, amava a bebida.

Fácil foi chegar na conclusão do que fazer em seguida: encher a cara. Já tinha passado tempo demais pensando em coisas que o levariam só a morte. Porque discutir a morte, se podia saboreá-la, aos pouco claro.

O primeiro copo de vodka foi servido cedo nesse dia.

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